O Ambulatório Médico de Especialidades (AME) de Taquaritinga está proibido de realizar qualquer tipo de cirurgia, inclusive procedimentos de catarata, por força de liminar concedida nesta terça-feira, 20 de maio, a pedido do promotor Ilo Wilson Marinho Gonçalves Junior.
A decisão foi tomada após o Ministério Público de São Paulo (MPSP) demonstrar que ao menos doze de 23 pacientes perderam total ou parcialmente a visão após passarem por cirurgias oftalmológicas realizadas em regime de mutirão na unidade.
Fiscalizações das Vigilâncias Sanitárias Municipal e Estadual identificaram falhas graves no centro de esterilização de materiais do equipamento público. Assinada pelo juiz Clovis Humberto Lourenço Junior, a liminar também determinou a interdição imediata do Centro de Material e Esterilização do AME.
A Fundação Santa Casa de Misericórdia de Franca, responsável pela administração da unidade, e a Fazenda Pública do Estado de São Paulo terão o prazo de 60 dias para sanar todas as irregularidades apontadas. O descumprimento da decisão implicará multa diária de R$ 2 mil, limitada a R$ 1 milhão.
A medida judicial impõe ainda outras obrigações, como a apresentação, no mesmo prazo, de um plano de ação voltado ao aprimoramento dos protocolos médicos e operatórios. Também deverá ser garantida assistência médica contínua e integral às vítimas.
O atendimento especializado deve ser oferecido não apenas em oftalmologia, mas em todas as áreas eventualmente necessárias em razão dos danos sofridos. Isso inclui, por exemplo, cirurgias de transplante de retina e fornecimento de lente escleral estética ou prótese ocular.
No processo, o promotor Gonçalves Junior apontou que as lesões oculares apresentadas no pós-operatório foram causadas pela infusão intraocular de uma substância tóxica. Na ação civil, ele requer que os réus sejam condenados a pagar R$ 3 milhões em indenização, valor que deverá ser revertido em investimentos na saúde pública local. Paralelamente à atuação cível, os fatos estão sendo investigados também na esfera criminal.
A Secretaria de Estado da Saúde informou que todos os profissionais que atuaram nos atendimentos foram afastados e os pacientes estão sendo acompanhados por equipe especializada no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto.
Uma sindicância foi instaurada em todas as unidades gerenciadas pela Organização Social de Saúde (OSS) Santa Casa de Franca, bem como um chamamento público para a contratação de uma nova OSS para a administração do AME.
Ao menos 13 pacientes relataram complicações, com perda total ou parcial da visão, após serem submetidos a cirurgias em um mutirão no Ambulatório de Especialidades Médicas de Taquaritinga em 21 de outubro do ano passado.
Depois das denúncias, eles foram encaminhados para avaliações no HC de Ribeirão Preto e, segundo o Grupo Santa Casa, também foram inseridos na fila de transplante de córnea do estado em dezembro. As cirurgias no AME de Taquaritinga foram suspensas, desde então.
Segundo sindicância interna instaurada pelo Grupo Santa Casa de Franca, houve falha pelas equipes médica/assistencial no cumprimento do protocolo institucional vigente, resultando no uso inadequado de produtos durante procedimentos cirúrgicos realizados exclusivamente em 21 de outubro de 2024.”
Conforme os protocolos institucionais, a assepsia deve ser realizada com PVPI (iodo-povidona), de coloração roxa, permitindo identificação visual clara por todos os profissionais envolvidos na cirurgia. No entanto, foi constatado que a equipe utilizou clorexidina (de coloração transparente), dificultando a verificação visual do produto empregado.
“Além disso, identificou-se a inversão na ordem de aplicação dos produtos. Em vez de seguir o procedimento correto – onde a clorexidina é utilizada para assepsia e o soro Ringer para o selamento da incisão – houve o acidente, no qual a clorexidina foi aplicada em substituição ao soro Ringer”, diz nota enviada ao Tribuna.
Isso significa que no processo cirúrgico, a equipe médica/assistencial inverteu a ordem do uso dos produtos. Todos os profissionais diretamente envolvidos no caso foram afastados, pois, “apesar de ter sido um erro pontual, os pacientes tiveram consequências graves”, diz a OSS.
O erro afetou apenas um olho de cada paciente, já que, por segurança, nunca se realizam cirurgias simultâneas nos dois olhos, justamente para evitar riscos de perda total da visão. Dos doze pacientes afetados, cinco realizavam a segunda cirurgia, pois já haviam realizado a operação bem-sucedida no primeiro olho.